Será que tal interpretação faz jus àquilo que Jesus intentava dizer aos Seus discípulos?
Nessa parábola, Jesus está falando da chegada do reino, e não de Sua segunda Vinda. E o Seu reino foi inaugurado ainda em Seu primeiro advento.
O texto diz que “o reino dos céus será semelhante a dez virgens que, tomando as suas lâmpadas, saíram ao encontro do noivo” (Mt.25:1).
As virgens da parábola não seriam desposadas pelo noivo. Elas eram como “madrinhas” da noiva. Fazia parte do ritual de bodas judaicas, o encontro das “madrinhas” virgens, com o noivo, para acompanhá-lo até a noiva.
Ora, o noivo da parábola representa o próprio Cristo. E a noiva, embora não figure na parábola, é a Igreja. Quem seriam, então, as virgens? Elas representam o povo judeu.
É interessante que em outra passagem, João Batista se apresenta como “o amigo do Noivo”. Além das virgens madrinhas, o noivo também era assistido por um amigo, geralmente, aquele que fosse considerado o melhor amigo. Assim como não podemos confundir o noivo com o amigo do noivo, também não podemos confundir a noiva com as dez virgens.
Ao ser confundido com o Cristo, João respondeu: “Eu não sou o Cristo, mas sou enviado adiante dele. A noiva pertence ao noivo. O amigo do noivo, que lhe assiste, espera e ouve, e alegra-se muito com a voz do noivo. Essa alegria é minha, e agora está completa” (Jo.3:28b-29).
De acordo com o protocolo, as virgens madrinhas deveriam sair ao encontro do noivo, portando lâmpadas devidamente acesas.
Segundo a parábola, dentre as dez virgens, cinco eram prudentes, e cinco eram insensatas.
“As insensatas, ao tomarem as suas lâmpadas, não levaram azeite consigo. Mas as prudentes levaram azeite em suas vasilhas, com suas lâmpadas. Demorando o noivo, todas elas acabaram cochilando e dormindo” (Mt.25:3-5).
Repare no detalhe: todas elas acabaram dormindo. Ficaram desatentas, e cochilaram. A diferença entre elas era o suplemento extra de azeite que cinco delas haviam trazido. Portanto, a questão não era apenas de vigilância, como bradam os pregadores, mas de prevenção e prudência. Ser prudente aqui, é ser precavido.
Por isso, não parece razoável usar esse texto para amedrontar os crentes, fazendo-os duvidar de sua salvação, temendo que o Senhor lhes flagre “dormindo”.
Paulo escreve acerca disso em sua primeira epístola endereçada à igreja em Tessalônica:
“Mas, irmãos, acerca dos tempos e das épocas, não necessitais de que se vos escreva, pois vós mesmos sabeis muito bem que o dia do Senhor virá como o ladrão de noite (sem aviso prévio) (...) Mas vós, irmãos, já não estais em trevas, para que esse dia vos surpreenda como um ladrão. Todos vós sois filhos da luz, e filhos do dia. Nós não somos da noite, nem das trevas. Não durmamos, pois, como os demais, mas vigiemos, e sejamos sóbrios. Pois os que dormem, dormem de noite, e os que se embriagam, embriagam-se de noite. Nós, porém, que somos do dia, sejamos sóbrios (...) Pois Deus não nos destinou para a ira, mas para alcançar a salvação por nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu por nós, para que, quer vigiemos, quer durmamos, vivamos juntamente com ele” (5:1-2,4-8a, 9-10).
É claro que devemos “vigiar”, isto é, estar atentos, para que não sejamos surpreendidos. Entretanto, quer vigiemos ou durmamos, nosso encontro com o Senhor é garantido. O risco é o de sermos pegos de surpresa, e não o de sermos condenados.
Voltando à parábola:
“Mas, à meia-noite ouviu-se um grito: Aí vem o noivo, saí ao seu encontro” (Mt.25:6).
Esse “grito-convocação” foi o grito dos profetas, dos quais, João foi o último expoente. Apenas parte do povo judeu deu ouvidos ao alarde profético. A outra parte se manteve surda e insensível ao apelo de Deus. Faltava-lhes o azeite, a luz, a revelação. Seu coração foi endurecido.
Paulo compreendia bem tal situação, pois a havia testemunhado. Em sua última investida evangelística direcionada aos judeus, o apóstolo dos gentios se viu profundamente decepcionado com seus patrícios.
Segundo o relato de Atos, dentre os judeus que vieram ao seu encontro em Roma, “alguns foram persuadidos pelo que ele dizia, mas outros não creram” (28:24). Os que criam eram as virgens prudentes, e os que desdenhavam eram as virgens insensatas. Suas lâmpadas estavam apagadas. Lucas diz que eles “discordaram entre si, e começaram a sair, havendo Paulo dito esta palavra: Bem falou o Espírito Santo a nossos pais pelo profeta Isaías: Vai a este povo, e dize: Ouvindo, ouvireis, e de maneira nenhuma entendereis; vendo, vereis, e de maneira nenhuma percebereis. Pois o coração deste povo está endurecido; com os ouvidos ouviram pesadamente, e fecharam os olhos, para que jamais vejam com os olhos, nem ouçam com os ouvidos, nem entendam com o coração, e se convertam e eu os cure” (Atos 28:25-27).
Dentre os filhos de Israel, somente o remanescente pôde entrar no Reino de Deus. Quem são os remanescentes? Os que deram ouvidos ao grito profético, e foram ao encontro do Noivo. Isso é confirmado por outras passagens, como aquela que Paulo menciona aos Romanos: “Ainda que o número dos filhos de Israel seja como a areia do mar, o remanescente é que será salvo”( Rm.9:27).
Somente os que atentarem para as profecias, e se derem conta de que elas falam de Jesus de Nazaré, e confiarem em Sua provisão para a salvação, serão, de fato, salvos.
Ninguém será salvo por pertencer a uma etnia, ou por ter o sangue de Abraão correndo em suas veias.
É Paulo quem declara: “Tenho declarado tanto aos judeus como aos gregos que devem se converter a Deus, arrepender-se e ter fé em nosso Senhor Jesus Cristo” (At.20:21).
Por todo o livro de Atos encontramos o cumprimento da parábola das virgens. Em Antioquia, por exemplo, “muitos dos judeus e dos prosélitos devotos seguiram a Paulo e Barnabé, os quais, falando-lhes, exortavam-nos a que permanecessem na graça de Deus”(At.13:43). Esses equivalem às “virgens prudentes”. Mas logo abaixo no texto, lemos que “os judeus, vendo a multidão, encheram-se de inveja, e, blasfemando, contradiziam o que Paulo falava” (v.45). Esses equivalem às “virgens insensatas”.
A parábola prossegue:
“Então todas aquelas virgens se levantaram e prepararam as suas lâmpadas. E as insensatas disseram às prudentes: Dai-nos do vosso azeite; as nossas lâmpadas se apagam. Mas as prudentes responderam: Não seja o caso que nos falte a nós e a vós. Ide antes aos que o vendem, e comprai-o” (Mt.25:7-9).
De quem elas deveriam comprar o azeite? Onde encontrariam a luz de que suas lâmpadas necessitavam? Com a palavra, Simão Pedro, o apóstolo da circuncisão:
“E temos ainda mais firme a palavra dos profetas, à qual bem fazeis em estar atentos, como a uma luz que ilumina em lugar escuro, até que o dia clareie, e a estrela da manhã surja em vossos corações” (2 Pe.1:19).
Revelação não é algo que se possa receber de terceiros. Não há como terceirizá-la. Tem-se que buscar na fonte. Podemos adquirir informação através de outros, mas só adquiriremos “azeite” para nossas lâmpadas, se buscarmos diretamente na fonte. Por isso Jesus insistia: “Examinai as Escrituras...”
Por muitos séculos, os judeus negligenciaram a Palavra. Por isso, foram incapazes de reconhecer o Messias, quando Ele apareceu nas ruas da Galiléia.
Quando procuraram por Paulo em Roma, queriam um pouco de azeite para suas lâmpadas, mas a porta já se havia fechado. Como disse Jesus, o Reino lhes fora tirado, e entregue a um outro povo, a igreja. Somente os remanescentes “entraram com ele para as bodas”.
Para esse “remanescente”, a porta sempre estará aberta. Como bem afirmou o apóstolo: “Assim, pois, também agora neste tempo ficou um remanescente, segundo a eleição da graça” (Rm.11:5).
Como vimos, a parábola das virgens jamais teve a intenção de causar pânico aos seguidores de Cristo. Não estamos nem entre as cinco prudentes, nem entre as cinco insensatas. Somos a única noiva do Cordeiro, aquela que está sendo preparada para ser apresentada “como uma virgem pura a um marido, a saber, a Cristo” (2 Co.11:2).
Christus Victor!
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